A velha discussão sobre quem teria inventado o heavy metal já rendeu várias teorias e inúmeras bandas já foram citadas como tal. Entre elas, estão nomes como o obscuro Blue Cheer e seu álbum Vincebus Eruptum, o Jeff Beck Group, que contava com nomes como Rod Stewart e Ronnie Wood em sua primeira formação, além do lendário guitarrista, e o eterno trio de ferro da música pesada, os fantásticos Led Zeppelin, Deep Purple e Black Sabbath (esse último, o mais aceito pela maioria como pioneiros no estilo).
Obviamente todos tiveram seus méritos e importâncias inegáveis, mas na verdade todos ainda faziam, essencialmente, hard rock, o que era agressivo de certo modo, mas era apenas um embrião do que estava por vir nos anos seguintes. E se têm algum grupo que represente essa mudança da maneira mais concreta possível, esse é, definitivamente, o Judas Priest.
Na segunda metade da década de 70, não havia nada que fosse comparado ao que a trupe comandada por Rob Halford estava fazendo musicalmente em seus discos. Isso sem falar na fenomenal dupla de guitarristas Glen Tipton e KK Downing, que elevaram o significado das 'guitarras-gêmeas' a patamares nunca antes alcançados. E Sad Wings Of Destiny, lançado em 1976 pela antiga gravadora Gull Records e segundo disco oficial de estúdio da discografia da banda, marca o início disso tudo.
Ainda que já tivessem lançado dois anos antes o debut Rocka Rolla, o mesmo ainda apresentava as mesmas características dos citados no início do texto, além da qualidade claramente duvidosa graças à fraca produção. Em Sad Wings, porém, tudo é diferente. Podemos ver a banda absorvendo toda a influência dos grupos seminais do estilo, além de uma veia progressiva bastante comum em meados da década de 70, e ao mesmo tempo criando uma sonoridade própria e que não encontrava nada paralelo na época. Nem mesmo o bastante influente Rainbow, do ex-Purple Ritchie Blackmore e do finado Ronnie James Dio, com seu clássico álbum Rising lançado também em 76, chegava perto da atmosfera aqui atingida.
A curta introdução "Prelude" abre caminho para a inovadora "Tyrant", que com a linha de baixo mais marcante do velho Ian Hill, seu riff poderoso e arrasa-quarteirão, e os agudos impressionantes de Halford (o vocalista mais influente da história do metal) se sobressaindo nos alto-falantes, mostra-se algo totalmente à frente de seu tempo. A seguir, "Genocide" se aproxima mais do hard rock já citado anteriormente, mas com guitarras um tanto incomuns para o gênero.
"Epitaph" é a mais deslocada de todas do track-list, contendo apenas o piano (muito bem) tocado por Tipton e os vocais bem diferentes dos habituais de Rob, aqui mais graves e intimistas. Mas se engana quem pensa que essa faixa é um ponto negativo do registro. Após um breve 'descanso' para o ouvinte, o peso retoma forte em "Island Of Domination", que fecha a primeira parte do LP mantendo a qualidade intacta por aqui.
Abrindo o lado B, temos logo dois clássicos absolutos da banda, que seriam tocados em quase todos os seus shows ao longo dos anos. A épica "Victims Of Changes" data da época em que o desconhecido Al Atkins ainda cantava no grupo (o mesmo inclusive é creditado na composição), e apresenta guitarras impressionates em seus mais de sete minutos de duração. Vale citar também sua letra bastante reflexiva e que foge dos temas comuns do metal. E "The Ripper" nem merece maiores comentários, basta ouví-la e conferir mais uma canção desse trabalho cuja sua estrutura seria copiada através de gerações nas décadas seguintes.
Fechando o disco, "Dreamer Deceiver" e "Deceiver" são praticamente duas partes de uma mesma canção, que aqui obviamente aparece dividida. Na primeira, temos quase que uma balada, começando bem lenta e que vai aos poucos crescendo conforme a bateria e o baixo se fazem presentes juntos às guitarras tradicionais de Downing e Tipton. Já a última, com seu andamento mais veloz e repleto de agressividade, serve como um contraponto bem encaixado à faixa que a antecede (teoricamente), e os belíssimos violões hipnotizantes em seu apoteótico encerramento dão a sensação de um digno 'gran finale' à uma das obras mais fundamentais da história do rock n' roll.
Por mais que o próprio Judas depois fosse se superar em termos de qualidade nos sucessores Sin After Sin e Stained Class, além de atingir seu ápice em termos comerciais com os multiplatinados British Steel e Screaming For Vengeance na década seguinte, foi em Sad Wings Of Destiny que eles realmente cravaram seu nome dentro da cena para sempre. Se você quer saber de onde vieram todos os elementos que seriam aprimorados ainda mais na famosa NWOBHM (New Wave Of British Heavy Metal, para quem não conhece), responsável por revelar ao mundo grupos como Iron Maiden, Saxon, Angel Witch, Def Leppard e Diamond Head, é simplesmente indispensável a audição desse maravilhoso disco.
01 - Prelude
02 - Tyrant
03 - Genocide
04 - Epitaph
05 - Island Of Domination
06 - Victims Of Changes
07 - The Ripper
08 - Dreamer Deceiver
09 - Deceiver
Rob Halford (voz)
Glen Tipton (guitarra, piano)
KK Downing (guitarra)
Ian Hill (baixo)
Alan Moore (bateria)
Ps: Na versão em CD, os lados A e B, que começam, respectivamente, por "Tyrant" e "Victims Of Changes", foram invertidos.
Matheus Henrique
Parabens,
ResponderExcluirótimo texto!
abs,